Caldas Novas: água quente em perigo |
Escrito por Cláudio Vicente e Nayra Thyemi |
Crescimento da cidade põe em risco maior riqueza natural
Será
possível conciliar crescimento do potencial turístico e manutenção dos
aqüíferos quentes? Com 1 milhão de turistas por ano, Caldas Novas (GO) está no
limite da exploração de sua maior riqueza: as águas termais.
Caldas tem 62 mil habitantes, 151 poços explorados por 62 mineradoras, e cresce
cerca de 7% ao ano com a construção de novos bairros, condomínios verticais,
clubes e flats.
Esta
questão se agravou em 1996, quando a intensa exploração resultou na grande
crise da água termal na cidade. Poços e até nascentes naturais secaram. Naquela
época, qualquer pessoa podia extrair água do subsolo. Até a água canalizada era
quente. Isso quase levou ao colapso: as reservas desceram ao menor nível. “A
água quente vai acabar”, anunciavam os jornais. O turismo baixou e os
investidores desapareceram.
Um
aqüífero é um grande reservatório subterrâneo de água renovável, porém
limitada. Há dois aqüíferos bem abaixo de Caldas: Araxá e Paranoá. A
exploração excessiva pode provocar uma queda do nível da água. Com essa
diminuição, há um processo de reacomodação do subsolo, o que pode causar desde
tremores de terra até o rebaixamento da cidade, o que aconteceu na cidade do
México e em Tóquio.
Quando
houve a grande crise da década de 1990, muitas questões tiveram que ser
respondidas. Precisava-se saber mais sobre a capacidade dos reservatórios e
como ocorria o aquecimento. Na falta das respostas, o Departamento Nacional de
Produção Mineral (DNPM) proibiu a perfuração de novos poços e instalou
hidrômetros para controlar a exploração. Até os dias de hoje o controle da água
quente se dá por cotas.
Injeção de água fria
Um vulcão
debaixo da terra? Que nada. Apesar da temperatura elevada em Caldas, pesquisas
recentes descartam a relação da água quente com vulcanismo. Ela é aquecida em
fendas de rochas impermeáveis no subsolo, que formam dois reservatórios. Em
cada um a água chega a temperaturas diferentes, sendo que o mais próximo da
superfície, o Araxá, tem em média 37 graus, enquanto o mais profundo, Paranoá,
chega a 59 graus.
Uma
pesquisa sobre a origem, utilização, operação e manutenção dos aqüíferos está
no momento sendo custeada pela Associação das Empresas Mineradoras de Águas
Termais de Goiás (Amat), organização que reúne os empresários donos de poços. A
idéia dos estudiosos é de provocar arrepios: injetar água fria nos aqüíferos
termais para garantir o banho quente dos turistas.
O geólogo
Fábio Haesbaert, atual presidente da Amat, juntamente com pesquisadores da
Universidade de Brasília e da Universidade Técnica de Berlim foram os
idealizadores da pesquisa de quase R$ 2 milhões. Desde 2007, os pesquisadores
vêm coletando informações sobre clima, temperatura e vazão da água termal. “Os
dados viabilizam um modelo geológico-matemático para gerenciar os aqüíferos”,
aponta Fábio.
Os
estudos mostram que os aqüíferos são abastecidos por águas de chuva captadas
principalmente na Serra de Caldas. O local onde está assentada a cidade é
também um importante ponto de captação, principalmente do aqüífero Araxá. Mas
“a cidade cresceu muito, está toda impermeabilizada”, afirma Fábio. “O asfalto
e as construções acabam com a vegetação. Deixa de existir aquela infiltração que
sempre existiu.”
Hoje o
nível dos aqüíferos é considerado bom. Em setembro, foi de 642,12 metros de
profundidade para o Araxá e 672,30 metros para o Paranoá. Em julho deste ano,
com a alta temporada e a falta de chuvas, o nível baixou quatro metros, ainda
bem longe dos quase 27 metros a que chegou em janeiro de 1996, o menor nível
histórico e que levou à reação dos moradores, turistas e autoridades.
Rentável
monopólio
Neste
ano, o projeto da Amat foi escolhido como um dos cinco finalistas, dentre 273
inscritos no Prêmio Ana, da Agência Nacional de Águas. Em setembro, a Ana
enviou o chefe de gabinete Horácio Figueiredo para conhecer de perto o projeto.
“Estar entre os cinco já é uma honra”, afirmou ele. O projeto é importante para
trazer uma maior visibilidade à questão da água termal.
Segundo o
geólogo Haesbaert, a água quente não vai esfriar nem acabar, porém, é preciso
monitoramento e controle da perfuração e da exploração dos poços, bem como uma
pesquisa constante sobre o comportamento dos aqüíferos. O geólogo afirma que,
na verdade, o aqüífero Araxá está esquentando, como conseqüência da mistura com
as águas do Paranoá. Apesar disso, a concepção de alguns banhistas é de que a
água estaria esfriando.
Uma
possível explicação para essa percepção dos banhistas pode ser a mistura de
água quente com água fria que alguns clubes e mineradoras fazem. Às vezes o
empresário fornecedor vende a água já misturada, outras vezes, o próprio
flat/clube faz a mistura, alegando que a água viria muito quente para o consumo,
como afirma o síndico de um flat, Samuel Florindo.
A água
quente pode não estar esfriando mas, para que os aqüíferos não baixem os níveis
além de um limite sustentável, há um rígido controle do DNPM, que não concedeu
mais nenhuma autorização paraperfuração de
novos poços desde 1996. Atualmente os mais de 150 poços são
patrimônio de apenas 62 mineradoras. Elas abastecem todos os empreendimentos
termais da cidade.
Para
Florindo, a proibição da perfuração de novos poços é um meio de grandes grupos
manterem um “monopólio das águas”, segundo ele “um negócio muito rentável”.
Somente em seu condomínio, o Eldorado Flat Service, há um gasto de R$ 12,5 mil
por mês com a compra de 5 mil metros cúbicos de água. Um dono de poço precisa
apenas abrir e fechar as torneiras.
A
exploração de poços é um mercado milionário de venda de recursos minerais. Um
poço hoje custa em torno de R$ 1 milhão. A vazão média do Araxá é de 500 litros
por segundo, enquanto do Paranoá é de mil litros por segundo. Cada dono de poço
tem uma cota. Ele comercializa a água excedente, não só sob a forma quente,
como misturando com água fria, o que multiplica os lucros.
O DNPM
escolheu um método de controle baseado na proibição da abertura de novos poços,
o que restringe a exploração a poucos, e estabelece uma possibilidade de
exploração da água muito maior do que cada um dos empresários necessita. Do ponto
de vista político e econômico, pode-se questionar se os interesses dos grandes
grupos não estariam definindo os parâmetros de exploração da riqueza mineral da
cidade.
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Fonte:
http://www.fac.unb.br/revista20082/index.php?option=com_content&view=article&id=39:claudio-vicente-e-nayra-thyemi&catid=1:aguas&Itemid=2
Lamentável essa exploração desenfreada em Caldas Novas. Uma cidade com 100 mil habitantes precisa de apenas 250 litros por segundo para ser abastecida, enquanto um poço lá, pode render 1000 litros por segundo. Não precisa ser especialista, muito menos gastar 2 milhões de reais, para saber que um dia, isso vai acabar, lamentável.
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